Artigo 39 do CDC Comentado
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1 – DOUTRINA COM COMENTÁRIOS SOBRE O ART. 39 DO CDC
Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:
I – condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;
II – recusar atendimento às demandas dos consumidores, na exata medida de suas disponibilidades de estoque, e, ainda, de conformidade com os usos e costumes;
III – enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço;
IV – prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços;
V – exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;
VI – executar serviços sem a prévia elaboração de orçamento e autorização expressa do consumidor, ressalvadas as decorrentes de práticas anteriores entre as partes;
VII – repassar informação depreciativa referente a ato praticado pelo consumidor no exercício de seus direitos;
VIII – colocar, no mercado de consumo, qualquer produto ou serviço em desacordo com as normas expedidas pelos órgãos oficiais competentes ou, se Normas específicas não existirem, pela Associação Brasileira de Normas Técnicas ou outra entidade credenciada pelo Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial – CONMETRO;
IX – recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos de intermediação regulados em leis especiais;
X – elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços;
XI – aplicar índice ou fórmula de reajuste diverso do legal ou contratualmente estabelecido;
XII – deixar de estipular prazo para o cumprimento de sua obrigação ou deixar a fixação de seu termo inicial a seu exclusivo critério.
Parágrafo único. Os serviços prestados e os produtos remetidos ou entregues ao consumidor, na hipótese prevista no inciso III, equiparam-se às amostras grátis, inexistindo obrigação de pagamento.
1. Rol exemplificativo
Mais uma vez a Lei n. 8.078 apresenta rol de condutas que é exemplificativo. É o que decorre da singela leitura do caput do art. 39. É verdade que essa redação do caput foi introduzida pela Lei n. 8.884, de 11 de junho de 1994 (a Lei Antitruste), e veio sanar uma aparente dificuldade que o veto ao inciso X da redação original teria trazido.
Com efeito, a redação anterior do caput do art. 39 era: “É vedado ao fornecedor de produtos e serviços: ...”, sem referência a outras práticas abusivas, que constam da redação atual. E o inciso X da redação original fora vetado. Ele dizia: “praticar outras condutas abusivas”. A supressão desse inciso deixava margem a dúvida a respeito da eventualidade de constatação de outras práticas abusivas praticadas e que não estavam elencadas no art. 39, que teria apresentado, assim, um rol taxativo de condutas.
Essa taxatividade não seria verdadeira mesmo sem a nova redação. É que a norma protecionista deve ser tida como exemplificativa quando se trata de apresentar rol de ações, condutas ou cláusulas contratuais que violem direitos do consumidor. Essa teleologia decorre não só do sistema da lei consumerista como do próprio elenco dos direitos básicos do consumidor, disposto no art. 6º. E para a hipótese em exame cabe a leitura do inciso IV, que dispõe, verbis:
“Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...)
IV – a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços”.
De qualquer forma, a modificação introduzida no caput pela Lei n. 8.884 resolveu, de vez, qualquer dúvida que se pudesse levantar.
Para concluir esta parte, comente-se, então, o veto ao inciso X original. As razões do veto foram as seguintes:
“O princípio do Estado de Direito (CF, art. 1º) exige que as normas legais sejam formuladas de forma clara e precisa, permitindo que os seus destinatários possam prever e avaliar as consequências jurídicas dos seus atos. É, portanto, inconstitucional a consagração de cláusulas imprecisas, sobretudo em dispositivo de natureza penal”.
Percebe-se claramente o equívoco do veto, tanto que a lei restaurou a redação original. Na realidade, o fato de a lei ter dito “praticar outras condutas abusivas” não era, de maneira alguma, inconstitucional. A questão tinha caráter civil e não criminal, e a definição da abusividade dependeria da existência real da conduta tida como abusiva. Ora, aceitar as razões do veto seria o mesmo que admitir que, se o fornecedor agisse, concretamente, de forma abusiva, contra o consumidor e se tal conduta não figurasse no elenco do art. 39, a conduta seria válida. E isso é um absurdo, pois, na pior das hipóteses, configuraria o abuso do direito retratado no item 1 dos comentários iniciais a esta seção. Se for constatada qualquer prática abusiva, independente de ela estar ou não no rol das condutas do art. 39 (e dos demais artigos da Lei n. 8.078), não pode ser tida como válida.
Passemos, agora, à análise de cada um dos incisos do art. 39.
2. Inciso I – venda casada
Está disposto que é vedado:
“I – condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos”.
A norma do inciso I proíbe a conhecida “operação casada” ou “venda casada”, por meio da qual o fornecedor pretende obrigar o consumidor a adquirir um produto ou serviço apenas pelo fato de ele estar interessado em adquirir outro produto ou serviço.
A regra do inciso I veda dois tipos de operações casadas:
a) o condicionamento da aquisição de um produto ou serviço a outro produto ou serviço; e
b) a venda de quantidade diversa daquela que o consumidor queira.
É importante observar de início que a expressão “sem justa causa” está atrelada à segunda parte da proposição, porquanto a norma diz “bem como, sem justa causa, a limites quantitativos”.
Dessa forma a hipótese da letra a, isto é, o condicionamento da venda de um produto ou serviço à aquisição de outro produto ou serviço, é incondicionada. Não há justificativa nem por justa causa. Esta só é válida na quantidade ofertada.
No primeiro caso, existem exemplos bem conhecidos da prática abusiva. É o caso do banco que, para abrir a conta corrente do consumidor, impõe a manutenção de saldo médio ou, para conceder um empréstimo, exige a feitura de um seguro de vida. Há, também, o caso do bar em que o garçom somente serve bebida ou permite que o cliente continue na mesa bebendo se pedir acompanhamento para comer etc.
É preciso, no entanto, entender que a operação casada pressupõe a existência de produtos e serviços que são usualmente vendidos separados. O lojista não é obrigado a vender apenas a calça do terno. Da mesma maneira, o chamado “pacote” de viagem oferecido por operadoras e agências de viagem não está proibido. Nem fazer ofertas do tipo “compre este e ganhe aquele”. O que não pode o fornecedor fazer é impor a aquisição conjunta, ainda que o preço global seja mais barato que a aquisição individual, o que é comum nos “pacotes” de viagem. Assim, se o consumidor quiser adquirir apenas um dos itens, poderá fazê-lo pelo preço normal.
Em relação à quantidade, haverá situações parecidas. Contudo, como a norma permite a utilização de limites quantitativos quando justificada, duas hipóteses podem ocorrer: o limite máximo de aquisição e a quantidade mínima.
No primeiro caso, justifica-se que o fornecedor imponha limite máximo em época de crise. Por exemplo, há falta de óleo no mercado. É aceitável que o supermercado venda uma ou duas latas por pessoa.
No que respeita à imposição de compra de quantidade maior que aquela que o consumidor deseja, há que considerar os produtos industrializados que acompanham o padrão tradicional do mercado e que são aceitos como válidos. Por exemplo, o sal vendido em pacotes com 500g, e da mesma forma a farinha, os cereais etc. (a venda a granel é cada vez mais exceção).
Mas na quantidade haverá situações mais delicadas, que exigem atenta e acurada interpretação do sentido de justa causa. Por exemplo: o lojista faz promoções do tipo “compre 3 pague 2”. São válidas desde que o consumidor possa também adquirir uma peça apenas, mesmo que tenha de pagar mais caro pelo produto único no cálculo da oferta composta (o que é natural, já que a promoção barateia o preço individual).
Não se pode, na questão da venda casada, olvidar que desde 1962, com a Lei Delegada n. 4, de 26 de setembro daquele ano, a venda casada já estava proibida. Leia-se o art. 11, incisos (letras) f e i, verbis:
“Art. 11. Fica sujeito à multa no valor de 5.000 (cinco mil) até 200.000 (duzentas mil) vezes o valor do Bônus do Tesouro Nacional – BTN, da data da infração, sem prejuízo das sanções penais que couberem na forma da lei, aquele que: (...)
f) produzir, expuser ou vender mercadoria cuja embalagem, tipo, especificação, peso ou composição, transgrida determinações legais, ou não corresponda à respectiva classificação oficial ou real; (...)
i) subordinar a venda de um produto à compra simultânea de outro produto ou à compra de uma quantidade imposta”688.
A Lei n. 8.137, de 27 de dezembro de 1990, por sua vez, tipificou essa prática como crime. Veja-se seu art. 5º, II e III, que dispõe, verbis:
“Art. 5º Constitui crime da mesma natureza: (...)
II – subordinar a venda de bem ou a utilização de serviço à aquisição de outro bem, ou ao uso de determinado serviço;
III – sujeitar a venda de bem ou a utilização de serviço à aquisição de quantidade arbitrariamente determinada; (...)
Pena – detenção de 2 a 5 anos, ou multa”.
E, da mesma maneira, a Lei n. 8.884/94, em seu art. 21, XXIII, define como infração à ordem econômica “subordinar a venda de um bem à aquisição de outro ou à utilização de um serviço, ou subordinar a prestação de um serviço à utilização de outro ou à aquisição de um bem”.
3. Inciso II
A norma diz que é vedado:
“II – recusar atendimento às demandas dos consumidores, na exata medida de suas disponibilidades de estoque, e, ainda, de conformidade com os usos e costumes”.
A norma do inciso II é complementar à do art. 30 combinado com o 35.
Com efeito, ao examinarmos o art. 30 vimos que a oferta vincula o fornecedor, que está obrigado a seu cumprimento, concedendo-se ao consumidor, inclusive, os benefícios do art. 35, com a execução específica para obtenção do ofertado690.
O inciso II do art. 39 acresce à oferta a obrigação de vender os produtos existentes no estoque, ainda que não tivessem sido oferecidos. Isto é, basta ter em estoque para ser obrigado a vender.
Essa mesma disposição já aparecia na Lei n. 1.521, de 26 de dezembro de 1951, que definia crimes contra a economia popular. O art. 2º dispunha ser crime dessa natureza “recusar individualmente em estabelecimento comercial a prestação de serviços essenciais à subsistência; sonegar mercadoria ou recusar vendê-la a quem esteja em condições de comprar a pronto pagamento”. Aparecia também na citada Lei Delegada n. 4, de 1962, cuja norma dizia que o fornecedor não podia “sonegar gêneros ou mercadorias” nem recusar-se a vendê-los ou retê-los para fins de especulação (art. 11, letra b).
A Lei n. 8.137 faz o mesmo ao dispor, no art. 7º, VI, verbis:
“Art. 7º Constitui crime contra as relações de consumo: (...)
VI – sonegar insumos ou bens, recusando-se a vendê-los a quem pretenda comprá-los nas condições publicamente ofertadas, ou retê-los para o fim de especulação”.
E a Lei n. 8.884/94 fez o mesmo no inciso XIII do art. 21:
“Art. 21. As seguintes condutas, além de outras, na medida em que configurem hipótese prevista no art. 20 e seus incisos, caracterizam infração da ordem econômica:
(...)
XIII – recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, dentro das condições de pagamento normais aos usos e costumes comerciais”. (fonte: Nunes, Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. 7. ed. rev., atual. e ampl. — São Paulo: Saraiva, 2013)
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■ 10.3. CLASSIFICAÇÃO DAS PRÁTICAS ABUSIVAS
A doutrina costuma classificar as práticas abusivas valendo-se dos seguintes critérios:
■ quanto ao momento em que se manifestam no processo econômico;
■ quanto à fase em que se encontra a relação contratual.
Quanto ao momento em que se manifestam no processo econômico, as práticas abusivas podem ser produtivas ou comerciais.
■ As práticas produtivas abusivas estão relacionadas com a fase de produção, como no caso de se colocar, no mercado de consumo, qualquer produto ou serviço em desacordo com as normas expedidas pelos órgãos oficiais competentes ou, se normas específicas não existirem, pela Associação Brasileira de Normas Técnicas ou outra entidade credenciada pelo Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial — Conmetro — (comportamento vedado pelo art. 39, VIII, do CDC).
■ As práticas abusivas comerciais ocorrem numa fase pós-produção, como no contexto de prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços (conduta proibida pelo art. 39, IV, do CDC).
[ ... ]
No tocante à fase em que se encontra a relação contratual, as práticas abusivas podem ser classificadas como pré-contratuais, contratuais ou pós-contratuais.
■ As práticas abusivas pré-contratuais, como a própria nomenclatura sugere, ocorrerão antes de se chegar à fase do contrato. É o que acontece, por exemplo, com o comportamento do fornecedor de condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos (prática vedada pelo art. 39, I, do CDC).
■ Práticas abusivas contratuais estão presentes no próprio conteúdo do termo contratual que vem composto por alguma cláusula abusiva, como aquela que impossibilita, exonera ou atenua a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou implique renúncia ou disposição de direitos (cláusulas como esta são consideradas nulas de pleno direito pelo CDC, nos termos de seu art. 51).
■ Por fim, as práticas abusivas quanto à fase em que se encontra a relação contratual podem ser pós-contratuais, ou seja, manifestam-se após a “conclusão” do contrato de consumo. Isto porque, conforme visto acima, mesmo findo o contrato, persistem deveres decorrentes dos princípios da boa-fé e da lealdade, permanecendo as partes vinculadas durante algum tempo. Exemplo clássico dessa prática é repassar informação depreciativa, referente a ato praticado pelo consumidor no exercício de seus direitos (comportamento vedado pelo art. 39, VII, do CDC).
[ ... ]
■ 10.4. ROL EXEMPLIFICATIVO DAS PRÁTICAS ABUSIVAS NO CDC
O art. 39 do Código de Defesa do Consumidor traz um rol exemplificativo de práticas abusivas que são vedadas nas relações de consumo, nos seguintes termos: “É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas”.
A utilização da expressão “dentre outras” não deixa dúvidas de que o rol é meramente de exemplos, mesmo porque taxar em rol exaustivo as práticas abusivas seria inócuo, na medida em que sempre um novo comportamento ilícito seria praticado no mercado e o consumidor sairia prejudicado ante a ausência de previsão legal.
De fato, a melhor forma de disciplinar o tema consiste na eleição de exemplos para servirem de diretriz na avaliação de outras práticas abusivas.
Lembra Herman Benjamin, um dos integrantes da comissão de juristas que elaborou o anteprojeto do Código do Consumidor, que não “poderia o legislador, de fato, listar, à exaustão, as práticas abusivas. O mercado de consumo é de extremada velocidade e as mutações ocorrem da noite para o dia. Por isso mesmo é que buscamos, no seio da comissão, deixar bem claro que a lista do art. 39 é meramente exemplificativa, uma simples orientação ao intérprete”.
Desta forma, qualquer conduta em desconformidade com os padrões de boa conduta, ainda que não prevista no Diploma Consumerista, poderá se enquadrar na definição de prática abusiva.
O próprio CDC disciplina comportamentos abusivos em outros de seus dispositivos, como no caso do disposto no art. 42: “Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça”. A violação do citado mandamento legal configura, sem sombra de dúvidas, prática abusiva.
Outra questão relevante é a necessidade de se interpretar o art. 39 de forma objetiva, ou seja, as “chamadas ‘práticas abusivas’ são ações e/ou condutas que, uma vez existentes, caracterizam-se como ilícitas, independentemente de se encontrar ou não algum consumidor lesado ou que se sinta lesado. São ilícitas em si, apenas por existirem de fato no mundo fenomênico”.
Exemplo de prática promocional que não está prevista no rol do art. 39 do CDC e que vem se tornando muito comum no Brasil é a chamada “Black Friday” ou “Sexta-Feira Negra”, “termo criado pelo varejo nos Estados Unidos para nomear a ação de vendas anual que acontece sempre na última sexta-feira de novembro, após o feriado de Ação de Graças”. Nos Estados Unidos os preços reduzem tanto que os americanos são capazes de passar noites nas filas que se formam diante das grandes lojas para adquirirem produtos com preços realmente atrativos.
Em nosso país, a última Black Friday caiu no dia 29 de novembro de 2013, com ampla adesão do público consumidor, caracterizando verdadeiro recorde de vendas. Entretanto e infelizmente, uma pesquisa do Provar (Programa de Administração do Varejo) em parceira com a empresa Íconna constatou práticas abusivas com o aludido evento, pois o preço de 21,4% de 1.300 itens monitorados aumentaram o valor no dia 29, data da ação, enquanto apenas 9,53% tiveram o preço reduzido. Informa notícia do jornal Folha de S.Paulo que, no ano passado, 5,1% dos itens apresentaram aumento,[14] gerando indignação dos consumidores, que passaram a batizar o aludido evento promocional de “Black Fraude”.
■ 10.4.1. A venda casada como exemplo de prática abusiva no CDC
Dispõe o art. 39 do Código de Defesa do Consumidor em seu inciso I que é exemplo de prática abusiva “condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos”.
É a denominada venda casada pela doutrina e jurisprudência, na qual o fornecedor está proibido de vincular a aquisição de um produto a outro ou a contratação de mais de um serviço ou, ainda, a aquisição de um produto, desde que contrate certo serviço.
Concordamos plenamente com a leitura feita sobre o assunto por Rizzatto Nunes ao ensinar que “a operação casada pressupõe a existência de produtos e serviços que são usualmente vendidos separados. O lojista não é obrigado a vender apenas a calça do terno. Da mesma maneira, o chamado ‘pacote’ de viagem oferecido por operadoras e agências de viagem não está proibido. Nem fazer ofertas do tipo ‘compre este e ganhe aquele’. O que não pode o fornecedor fazer é impor a aquisição conjunta, ainda que o preço global seja mais barato que a aquisição individual, o que é comum nos ‘pacotes’ de viagem”.[15] Infelizmente, existem pessoas públicas que fazem sensacionalismo na TV sob o falso fundamento de querer defender o consumidor e acabam ensinando a este condutas que não estão legitimadas pelo CDC, como destacar um iogurte da cartela vendida com seis ou retirar uma gilete da caixa constituída por três unidades.
Em nossa opinião, a exigência pelo consumidor do cumprimento da lei no tocante à vedação da venda casada deverá levar em consideração os seguintes critérios:
■ que os produtos e os serviços sejam usualmente vendidos separados;
■ que a solicitação da unidade não desnature o produto — exemplo: se retirar um iogurte da cartela de seis, ninguém mais vai querer comprar os cinco remanescentes, nem poderia o fornecedor, nestes casos, vender o produto com a ausência de complemento;
■ que a conduta do consumidor não prejudique o fornecedor a ponto de este não conseguir mais vender determinado produto em razão da ausência de sua completude, contexto que ocorreria certamente caso o consumidor exigisse cem gramas a serem retiradas do saco de um quilo de arroz.
Situação que bem demonstra a prática abusiva da venda casada é aquela em que empresa cinematográfica somente admite o consumo de alimentos no interior do cinema se adquiridos em seu estabelecimento.
Percebam que neste caso o produto e o serviço são usualmente vendidos de forma separada e não há qualquer motivo plausível para vincular tal prática, caracterizando-se como verdadeiro exemplo de comportamento abusivo.
No mesmo sentido, é o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça no julgado infra, com os seguintes excertos extraídos:
■ Ao fornecedor de produtos ou serviços, consectariamente, não é lícito, dentre outras práticas abusivas, condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço (art. 39, I, do CDC).
■ A prática abusiva revela-se patente se a empresa cinematográfica permite a entrada de produtos adquiridos nas suas dependências e interdita o adquirido alhures, engendrando por via oblíqua a cognominada “venda casada”, interdição inextensível ao estabelecimento cuja venda de produtos alimentícios constituiu a essência da sua atividade comercial como, verbi gratia, os bares e restaurantes (REsp 744.602/RJ, Rel. Ministro Luiz Fux, 1ª T., DJ 15-3-2007).
Outra situação muito comumente praticada pelos bancos consiste em vincular ao mutuário do Sistema Financeiro de Habitação — SFH a contratação de seguro habitacional fornecido pela própria instituição financeira ou por empresa por ela indicada.
No entendimento do STJ, trata-se de prática violadora do art. 39, inciso I, do CDC por se caracterizar como venda casada: “A despeito da aquisição do seguro ser fator determinante para o financiamento habitacional, a lei não determina que a apólice deva ser necessariamente contratada frente ao próprio mutuante ou seguradora por ele indicada. Ademais, tal procedimento caracteriza a denominada ‘venda casada’, expressamente vedada pelo art. 39, I, do CDC, que condena qualquer tentativa do fornecedor de se beneficiar de sua superioridade econômica ou técnica para estipular condições negociais desfavoráveis ao consumidor, cerceando-lhe a liberdade de escolha” (REsp 804.202/MG, Rel. Ministra Nancy Andrighi, 3ª T., DJe 3-9-2008).
O tema é tão relevante que a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça sumulou a questão da seguinte forma: Súmula 473 do STJ — “O mutuário do SFH não pode ser compelido a contratar o seguro habitacional obrigatório com a instituição financeira mutuante ou com a seguradora por ela indicada” (DJe 19-6-2012). (fonte: Bolzan, Fabrício. Direito do consumidor esquematizado®. 2. ed. – São Paulo: Saraiva, 2014)
2 – JURISPRUDÊNCIA SOBRE O ART. 39 DO CDC
APELAÇÃO CÍVEL. REVISIONAL. RELAÇÃO DE CONSUMO.
Juros remuneratórios. Anatocismo. Laudo pericial conclusivo no sentido de que a taxa de juros contratada se encontra acima da média do mercado, constatado, ainda, o anatocismo. Ausência de previsão contratual. Impossibilidade. Contratação de seguro de vida. Venda casada. Dano moral configurado. Sentença de parcial procedência. Manutenção. 1.trata-se de ação de revisão de cláusulas contratuais c/c repetição do indébito c/c indenizatória, na qual pretende o autor a revisão do contrato de empréstimo, com a declaração de nulidade das cláusulas abusivas, procedendo a devolução, em dobro, do valor pago, referente ao seguro de vida introduzido no contrato de adesão, bem como a condenação da ré no pagamento de verba compensatória. 2. Sentença de parcial procedência, determinando a revisão do contrato para que sejam aplicados juros na média do mercado, na modalidade simples, afastando a capitalização e a utilização da tabela price, reconhecendo a prática de venda casada na contratação de seguro de vida e condenando a ré a restituir em dobro os valores indevidamente pagos pela autora, além do pagamento de verba compensatória no valor de R$ 6.000,00. Ambas as partes apelaram. 3. Destarte, o consumidor pode questionar o fornecedor sobre tais cláusulas mesmo depois de assinar o contrato e ainda pedir sua modificação, anulação ou revisão. 4. Laudo pericial conclusivo no sentido da existência de anatocismo, não previsto contratualmente. 5.assim, não há qualquer dúvida quanto à possibilidade de cobrança de juros compostos pelo réu apelante, uma vez que, repisa-se, esta questão restou dirimida em julgamento de recurso repetitivo pelo STJ. Contudo, não menos verdade é que o recorrente, para assim proceder, deveria comprovar que a possibilidade de capitalização dos juros restou pactuada pelas partes, prova da qual não se desincumbiu, levando, assim, à procedência do pedido. 6. Comprovada, ainda, a alegação de juros excessivos, sendo afirmado pelo expert no laudo pericial que a taxa contratual pactuada, qual seja, taxa nominal de 6,09%, se encontra acima da média do mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil no período da contratação. 7. Irretocável a sentença, ainda, ao reconhecer a prática abusiva de venda casada na contratação do seguro de vida. Embora a contratação de seguro de vida não seja proibida, o consumidor, nos contratos bancários em geral, não pode ser compelido a contratá-lo, sob pena de se ver caracterizada a sua abusividade, sendo certo que, na hipótese, a cobrança foi realizada de forma embutida ao valor do empréstimo solicitado junto ao banco réu. 8. Nesse trilho, não se vislumbra que tenha sido dada ao consumidor a oportunidade de optar pela contratação do seguro ora contestado, sendo certo que tal contrato possui evidentemente os contornos de contrato de adesão, uma vez que o seguro foi estabelecido na mesma oportunidade do contrato de empréstimo. Bem de ver que o banco não logrou êxito em comprovar que o seguro poderia ter sido suprimido do negócio jurídico firmado entre as partes. 9. Desse modo, tem-se caracterizada a venda casada, impondo-se, portanto, a anulação de tal contratação, nos termos do art. 39, I, do CDC. 10. Dano moral configurado. As cobranças indevidas, em dissonância com os termos contratados, provocam desestabilização orçamentária e, no mais das vezes, um endividamento do consumidor, dando origem à abalo psíquico e moral. Nesse diapasão, tem-se que os fatos narrados ultrapassaram os limites do mero aborrecimento cotidiano, tampouco configuram apenas uma cobrança indevida, configurando dano moral in re ipsa, gerando, assim, o dever de indenizar. 11. Quantum devidamente fixado em R$ 6.000,00.12. Manutenção da sentença. 13. Desprovimento dos recursos. (TJRJ; APL 0069771-98.2016.8.19.0002; Niterói; Oitava Câmara Cível; Relª Desª Mônica Maria Costa Di Piero; DORJ 07/02/2022; Pág. 313)
PLANO DE SAÚDE. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C.C. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
I. Autora que submeteu à operadora proposta de contratação de plano de saúde individual/familiar, informando que apresenta quadro de microcefalia e autismo. Comunicação de cancelamento da proposta, sem qualquer justificativa por parte da operadora, mesmo após o questionamento da consumidora. Sentença de parcial procedência. Conduta abusiva reconhecida. Violação ao artigo 39, IX, do CDC, bem como à Súmula Normativa nº 27/2015 da ANS. Sentença que condenou a ré a aceitar a adesão da autora ao plano de saúde, facultando à operadora, contudo, inserir cláusula de cobertura parcial temporária para doenças pré-existentes, nos termos da legislação. Irresignação da autora quanto à cobertura parcial temporária e ao afastamento dos danos morais. Acolhida parcial que se impõe. II. Deve ser delimitado que a faculdade garantida à recorrida de inserir no contrato cláusula de cobertura parcial temporária está condicionada à submissão da apelante a uma avaliação médica. Entendimento sedimentado na Súmula nº 105 desta Corte. A mera informação prestada pela consumidora não serve à comprovação da pré-existência da doença, dada a sua notória hipossuficiência técnica. III. Danos morais. Configuração. Indevida recusa de de contratação que impôs à consumidora desassossego anormal. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. Arbitramento da indenização em R$ 10.000,00. Valor que compõe a lesão experimentada. Incidência do artigo 944 do Código Civil. APELO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSP; AC 1001426-70.2021.8.26.0462; Ac. 15351983; Poá; Terceira Câmara de Direito Privado; Rel. Des. Donegá Morandini; Julg. 28/01/2022; DJESP 07/02/2022; Pág. 1822)
APELAÇÃO. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA.
1. Contratos de adesão são lícitos, previstos no sistema jurídico e, por si só, não têm capacidade de viciar a vontade do aderente, inexistindo, qualquer ofensa ao dever de informação. 2. Juros. Inaplicabilidade da limitação de juros prevista na Lei da Usura às instituições financeiras. Aplicação de taxa de juros dentro da legalidade. Índices que não destoam daqueles aplicados por outras instituições financeiras durante o período. Admissibilidade da capitalização de juros, conforme Medida Provisória nº 2.170/2001; Súmula nº 382, do STJ, e Súmula nº 596 do STF. 3. Tarifa de registro de contrato. Ato realizado, conforme certificado de registro e licenciamento do veículo juntado aos autos. Precedente do STJ (RESP nº 1.578.553). 4. Tarifa de avaliação do bem. Prestação do serviço comprovada, conforme laudo de avaliação do veículo apresentado em contestação. 5. Seguro. Convenção de seguro sem campo específico para escolher outras seguradoras de sua preferência. Venda casada (art. 39, inc. I, do CDC). Ilegalidade da cobrança. 6. Sentença reformada para determinar a restituição simples dos valores pagos a título de seguro, com acréscimo de correção monetária desde os desembolsos (Súmula nº 43 do STJ) e de juros de mora a contar da citação (art. 405 do CC). Sucumbência mínima do réu. Recurso parcialmente provido. (TJSP; AC 1000399-87.2021.8.26.0418; Ac. 15333861; Paraibuna; Décima Quinta Câmara de Direito Privado; Rel. Des. Elói Estevão Troly; Julg. 21/01/2022; DJESP 07/02/2022; Pág. 2066)
REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO.
Financiamento de veículo. Sentença de improcedência. Recurso do autor. SEGURO. Convenção de seguro sem campo específico para escolher outras seguradoras de sua preferência. Venda casada (art. 39, inc. I, do CDC). Ilegalidade da cobrança. Recurso provido. CAPITALIZAÇÃO DE PARCELA PREMIÁVEL (CAP. Parc. Premiável). Contrato que não prevê justificativa para cobrança do encargo. Ausência de campo específico para escolher outras seguradoras de sua preferência. Ilegalidade da cobrança. Recurso provido. REGISTRO DE CONTRATO E AVALIAÇÃO DE BEM questão decidida à luz do RESP 1.578.553-SP, onde por unanimidade, para efeitos do art. 1.040 CPC (recurso repetitivo), pacificou a controvérsia sobre legalidade da cobrança. Declaração de abusividade se não comprovada a prestação de serviços pelo banco. Análise do caso concreto. Exegese do art. 373, II do CPC. Apresentação de CRLV com registro da alienação fiduciária. Possibilidade de cobrança da tarifa de registro de contrato. O mesmo não ocorre com a tarifa de avaliação de bem. Exegese do art. 373, II do CPC. Ausência de juntada de laudo de avaliação do veículo. Abusividade da tarifa de avaliação de bem que é medida de rigor. Recurso provido. RESTITUIÇÃO EM DOBRO. Aplicação do atual entendimento do STJ. Desnecessidade de comprovação de má-fé para restituição de valores em dobro. Descontos indevidos. Restituição em dobro que deve ser aplicada. Recurso provido. TAXA DE JUROS. Alegação de que foi aplicada taxa de juros superior à média de mercado. Inocorrência. Abusividade não configurada. Recurso não provido. DANO MORAL. Pretensão à indenização por danos morais Impossibilidade. Não configuração. Fatos que não causaram qualquer ofensa à honra objetiva da autora, mas tão somente dissabor. Circunstâncias que não preenchem os requisitos geradores de dano moral, eis que não houve qualquer prejudicialidade quanto à moral da recorrente. Precedente. Recurso não provido. DISCIPLINA DA SUCUMBÊNCIA. Autor que decaiu de parte mínima de sua pretensão. Custas e despesas processuais a cargo do banco réu. Além de honorários fixados em 20% do valor da condenação. DISPOSITIVO. Recurso parcialmente provido. (TJSP; AC 1005498-91.2021.8.26.0077; Ac. 15336699; Birigui; Décima Quinta Câmara de Direito Privado; Rel. Des. Achile Alesina; Julg. 25/01/2022; DJESP 08/02/2022; Pág. 1773)
APELAÇÕES CÍVEIS. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DECLARATÓRIA C/C INDENIZATÓRIA.
Instituição bancária. Empréstimo. Cartão de crédito consignado. "Venda casada". Prática abusiva (art. 39, I, do CDC). Juros excessivos. Devolução em dobro (art. 42, § único, do CDC). Dano moral não configurado. Aplicação dos verbetes sumulares nºs 75, 330 do TJRJ e 297, do STJ. Irresignação das partes. Manutenção da sentença apelada. Cuida-se de ação de obrigação de fazer c/c indenizatória, julgada parcialmente procedente, para declarar a nulidade do contrato de cartão de crédito com crédito consignado, devendo este ser considerado contrato de empréstimo consignado com taxa média de mercado a ser apurado em liquidação de sentença e para condenar o banco réu a devolver em dobro, a quantia paga pelo autor no que exceder a satisfação integral do valor do empréstimo consignado. Aplicação do disposto no enunciado nº 297, da Súmula de jurisprudência do Superior Tribunal de justiça: "o CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR é aplicável às instituições financeiras". Malgrado a cópia do contrato de empréstimo originário indique a existência de cláusula expressa indicando a pactuação de juros (capitalizados) entre as partes, configurou-se a "venda casada", in casu, prática vedada pela legislação consumerista, conforme o art. 39, I, do CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. Violação aos princípios da boa-fé, confiança e informação que devem nortear as relações jurídicas, com fulcro nos artigos 4º, I, III, IV e 31 do CDC, 113, 421 e 422 do Código Civil. Ademais, o contrato não prevê, de forma clara e ostensiva, a possibilidade de o cliente liquidar, antecipadamente, o débito, total ou parcialmente, mediante a redução proporcional dos juros e dos outros acréscimos, tampouco o termo final para cumprimento da obrigação ou o número de prestações para quitação do empréstimo. Afronta ao disposto nos artigos 46, 47, 51, IV e XV, 52, III, IV e V, 54, §§3º e 4º, todos do CÓDIGO DE PROTEÇÃO E DEFESA DO CONSUMIDOR (CDC), ensejando a conversão do contrato de cartão de crédito em crédito consignado, aplicando-se a taxa média de mercado. Consequentemente, qualquer valor cobrado e descontado dos contracheques do autor que supere o valor de juros usualmente cobrado pelo banco réu para empréstimos consignados deve ser tido como indevido, cabendo a sua devolução na forma do art. 42, § único, do CDC, haja vista tratar-se de cobrança, sem demonstração de qualquer engano justificável pela parte ré. Situação experimentada pelo autor que se tratou de mero aborrecimento ou dissabor, não suscetível, portanto, de indenização por danos morais, visto que seu nome não foi negativado. É mister ressaltar que o fato de a relação entre as partes litigantes ser de consumo não afasta a necessidade do autor (consumidor) produzir provas, ainda que indiciárias, dos fatos constitutivos do direito dito como violado. Precedentes do TJRJ. Incidência do disposto no verbete nº 330, da Súmula do TJRJ. Desprovimento dos recursos. (TJRJ; APL 0076272-86.2018.8.19.0038; Nova Iguaçu; Quarta Câmara Cível; Relª Desª Maria Helena Pinto Machado; DORJ 04/02/2022; Pág. 325)
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA DE REVISÃO CONTRATUAL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICABILIDADE. TAXAS DE JUROS REMUNERATÓRIOS. PARÂMETRO DE COBRANÇA. JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. ADMISSIBILIDADE. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. ENCARGOS MORATÓRIOS. COMPOSIÇÃO. PRECEDENTE DO STJ. TARIFAS BANCÁRIAS. REGISTRO DE CONTRATO. AVALIAÇÃO DO BEM. ENTENDIMENTO DO STJ FIRMADO SOB A ÓTICA DOS RECURSOS REPETITIVOS. AUSÊNCIA DE PROVA DA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS. SEGURO DE PROTEÇÃO FINANCEIRA. CLÁUSULA CONDICIONADA A CONTRATAÇÃO PERANTE SEGURADORA INTEGRANTE DO MESMO GRUPO ECONÔMICO. LIBERDADE DE ESCOLHA. AUSÊNCIA. ABUSIVIDADE EVIDENCIADA. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. RESTITUIÇÃO SIMPLES DOS VALORES DECLARADOS INDEVIDOS. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
I. As normas do Código de Defesa do Consumidor são aplicáveis às relações estabelecidas com instituições financeiras, conforme prevê a Súmula nº 297 do Superior Tribunal de Justiça. II. Nos termos da orientação jurisprudencial do STJ, não será considerada abusiva a taxa dos juros remuneratórios contratada quando ela for até uma vez e meia superior à taxa de juros média praticada pelo mercado, divulgada pelo Banco Central do Brasil, para o tipo específico de contrato, na época de sua celebração. III. É permitida a capitalização de juros em periodicidade inferior à anual nos contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/03/2000 (MP n. 1.963-17/2000, reeditada como MP n. 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada. lV. Conforme dispõe a Súmula nº 541 do STJ, A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada. V. Afigura-se legítima a cobrança de comissão de permanência no período de inadimplência, desde que o valor correspondente não ultrapasse o somatório dos juros remuneratórios capitalizados na forma e na taxa contratadas para o tempo de normalidade da operação, juros moratórios sem capitalização até o limite de 12% (doze por cento) ao ano e multa contratual de 2% (dois por cento), sem cumulação, excluídos quaisquer outros encargos. VI. Em julgamento realizado sob a disciplina dos recursos especiais repetitivos, o Superior Tribunal de Justiça considerou válidas as disposições contratuais que autorizam o ressarcimento de despesas com registro do contrato e avaliação do bem dado em garantia à instituição financeira credora, ressalvadas a abusividade da cobrança por serviço não efetivamente prestado e a possibilidade de controle da onerosidade excessiva em cada caso concreto. VII. Inexistindo comprovação do efetivo registro da alienação fiduciária incidente sobre o bem financiado em nome da própria autora, mediante anotação no Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo (CRLV) perante o órgão de trânsito competente, é indevida a cobrança da tarifa que remunera o serviço correspondente. VIII. Não havendo no processo documento que possa justificar a cobrança da tarifa de avaliação do bem, é vedado à instituição credora realizar a cobrança do referido encargo. IX. Não pode a instituição credora exigir que o contratante celebre o contrato de seguro com seguradora integrante de um mesmo grupo econômico, sob pena de caracterização de venda casada, prática coibida pelo art. 39, inciso I do Código de Defesa do Consumidor (RESP. Nº 1.639.259/SP). X. Relativamente à repetição de indébito, prevista no art. 42, parágrafo único do CDC e no art. 940 do Código Civil de 2002, é sabido que caberá a devolução em dobro dos valores efetivamente desembolsados pela parte e que foram cobrados indevidamente. Quando as cobranças decorrerem de ajustamento entre as partes e posteriormente forem tidas como indevidas, a devolução em dobro somente será viável se restarem comprovados o dolo ou a má-. (TJMG; APCV 5194208-23.2019.8.13.0024; Vigésima Câmara Cível; Rel. Des. Vicente de Oliveira Silva; Julg. 02/02/2022; DJEMG 03/02/2022)
Tópicos do Direito: CDC CDC art 39 código de defesa do consumidor
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